Nokia, marca que já foi líder, sai de cena

Reprodução Internet

RIO – Nunca a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies fez tanto sentido como no mundo tecnológico contemporâneo. Técnicas, produtos, ofícios e mercados que não se adaptam a um ambiente extremamente competitivo e em sucessiva mutação simplesmente desaparecem. E, nessa dinâmica fagocitária, é simbólica a transformação da marca Nokia em Microsoft Mobile, com a aquisição da tradicional companhia finlandesa pelo grupo americano.

A operação, avaliada em € 5,4 bilhões (US$ 7,5 bilhões), é mais um sinal de que as empresas do setor precisam se reinventar constantemente para não serem devoradas. Maior fabricante de celulares até 2012, com aparelhos robustos, baratos e eficientes, a Nokia – fundada em 1865 como uma fábrica de papel – começou a perder terreno em 2007, com o lançamento do iPhone, da Apple, e o avanço do sistema operacional da Google, o Android.

A aquisição da divisão de celulares da Nokia pela Microsoft, anunciada em setembro, será formalizada amanhã. A companhia – uma espécie de Davi da Finlândia que chegou a ameaçar o então Golias norte-americana Motorola – pertencerá totalmente à Microsoft e deverá se transformar na sua divisão de celulares. Será o fim de uma marca icônica e de um peso-pesado da economia finlandesa, que entre 1998 e 2007 contribuiu com um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) do país, segundo a revista “The Economist”.

— A Nokia ficou no passado, perdendo a corrida para Google e Apple — afirma o engenheiro Hermano Pinto, especialista em rede de telecomunicações.

Outro especialista, que pediu para não ser identificado, lembra que, na área de telecomunicações, tem sido comum a empresa que é comprada assumir a marca da compradora:

— Está sendo assim com a Motorola, comprada pela Google. Foi assim quando a sul-coreana BenQ comprou a Siemens. Esse é o jogo.

Não que o grupo finlandês não tivesse visão. Os celulares da Nokia foram os primeiros com câmera embutida. Mas a empresa continuou apostando em celulares baratos, o que reduzia sua margem de lucro. Além disso, ao insistir em manter um sistema operacional próprio, o Symbian, ela falhou ao não estimular a criação de aplicativos.

— A falha da Nokia foi sua dificuldade em migrar para um sistema operacional robusto, que permitisse o uso da internet nos celulares. Em 2004, a Nokia já sabia que seu sistema operacional não era adequado. Mas é difícil mudar a cultura de uma empresa muito arraigada em seus processos. Em 2008, lembro de estar em reuniões, discutindo o Android. Havia muita resistência, pois era uma plataforma aberta. Apesar de a Nokia ter vislumbrado que os celulares seriam as primeiras câmera fotográficas, não percebeu que eles também seriam o primeiro computador com internet de muitos usuários — diz Hermano.

E o coração dos consumidores é volúvel. Eles foram atraídos pela tecnologia da tela de toque, inovadora o suficiente para engendrar novos comportamentos e suscitar o desejo. Ter um iPhone passou a ser uma questão de identidade. Além disso, tanto a Apple como a Google contavam com uma ampla cadeia de desenvolvedores de programas para seus sistemas operacionais.

 

— Isso fez a Nokia estar sempre um passo atrás. Quando ela lançou o Lumia, não tinha esse catálogo de aplicativos. O que vimos, na verdade, foram as empresas de tecnologia, como Google, que comprou a Motorola, e Apple, com o sucesso de seu iPhone, entrando em telecomunicações. Agora, ocorre o mesmo com a Microsoft — ressalta Hermano.

 

A gigante norte-americana também vai administrar o domínio nokia.com e os “sites” sociais para clientes por até um ano, indicando o prazo em que ocorrerá a transição da marca Nokia para Microsoft Mobile. Depois disso, a Nokia retomará o controle do domínio para manter sua marca no futuro. Além disso, ficam fora da transferência para a Microsoft as fábricas da Nokia na Coreia e na Índia.

 

Segundo o blog da Microsoft, essa mudança será fundamental não apenas para a consolidação do Windows Phone, mas para atrair clientes via Nokia.

 

— Na verdade, a Microsoft já vinha trabalhando desde 2010 para chegar ao atual ponto. Tudo começou quando Stephen Elop assumiu a Nokia em 2010 e, anos depois, assumiu posto importante na Microsoft na divisão de dispositivos móveis. Foi uma ação, digamos, bem planejada — lembra uma fonte do setor que não quis ser identificada.

 

Apesar de o Windows Phone nunca ter caído no gosto popular, especialistas ressaltam que não se pode desprezar o papel que a Microsoft pode desempenhar no setor. Eles lembram que, no início dos anos 80, a Apple revolucionou a computação pessoal com o Macintosh.

 

— Aí veio a Microsoft com o Windows, e o resultado todos sabemos. Não se pode desprezar um concorrente como a Microsoft — afirma Hermano.

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